O sol da primavera ilumina o monitor pelas frestas da veneziana. O ar é gelado, porém primaveril. Uma certa sensação começa a subir pelo corpo e cobre o rosto de calor. Vontade imensa de sair correndo para o parque do ibirapuera. No fone, Bush. A música vem com a velocidade da brisa: Letting the cables sleep. O estômago traz a agonia dos vocais e as pernas entram em conflito com a mente que precisa, desesperadamente, entregar tudo no prazo. Hoje não tem trégua. A emoção sobe pelas veias e derrama aquela angústia frenética e sensivelmente explosiva. Pólvora nos olhos. Na boca umas letras misturadas com café forte. Na pele o arrepio constante. Volúpia. Há tempos não sentia o nó esganado na garganta, de quem quer se libertar das amarras da consciência. É tudo comedido; essa mecanização, esse foco. Disfarces para a inquietude, para a dispersão constante. Expiração da mente inundada por você e uns sonhos que não tenho dinheiro para comprar. Silêncio não é o caminho, ele diz na música. Séria constatação. Vê, eu não tenho saída. Minha covardia e o orgulho transbordam pelos olhos e eu sento na beira do cais com os pés balançando n'água. Mas a música me acalma. E acende a percepção. Um animal arisco e farejador, com seu instinto apurado e suas defesas violentas na terra presa nas patas. O coração que não pára de socar o peito, que nunca vai cessar. Eu sou essa mutação cortante e o veneno súbito que penetra na corrente sangüínea. Não há meios de conter. Eu não vou parar de viver. Eu me purifico e me salvo pela dor. Depois, volto pra casa com as botas gastas e é só.

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