Minha companheira, minha guardiã. Ela me acompanha por metade da minha vida, desde os 13 anos. Fez toda a minha alegria, me consolou, me deu tudo que eu mais queria: amizade incondicional. Agora ela está aqui, cabisbaixa. Ergue os olhos neste momento e eu lanço um beijo. Esconde o focinho. Ela sabe. Os cães vão pra longe quando chega a hora e com ela não está sendo diferente. Eu vim até ela. Porque chamei, chamei e ela não descia. Prefere ficar no quarto, na caminha. A Bel bem que tentou. Subiu nela, rolou d'um lado pro outro, esticou as perninhas traseiras e empurrou com força o corpinho da mãe na esperança de lhe captar atenção. Nada. Está inerte. concentrada em dar as últimas lambidas nas patinhas e me olhar enquanto escrevo sobre ela. Lembro quando era pequenina e roia tudo. Quina de mesa, peça de xadrez... E as meias que pegava e escondia atrás do sofá? hahaha Danada! Pulava feito doida de um sofá pro outro, corria em volta da mesa e parecia um bichinho doido depois de um choque elétrico. Agora a Bel deitou a cabeça nas costas dela. Foda, o bicho sente. Eu tento não chorar, mas puta merda, como é difícil! Sabe, era ela que me defendia quando alguém vinha me bater. Bastava levantar a mão pra mim e ela avançava. Depois de um tempo nem disso precisava. Pelo tom de voz ela já sabia se estavam brigando comigo e desatava a gritar com a pessoa. Montava guarda na porta do box na hora do meu banho. Ou na escada, porque tinha visibilidade de todos os acessos da casa. Mas a doença faz com que me espere na casinha, hoje. Ai se tentam me acordar! Ela berra, rosna e expulsa o fulano do meu quarto. Tadinha! Até aí já acordei... (risos) Mas a intenção é a melhor, sempre! Vai onde eu vou. É minha sombra. Gosta de música e se for agitada ela vira de costas e se esfrega freneticamente, como quem dança. Adora lagartear no sol, se enfiar embaixo das cobertas. E quando eu corto as unhas dela depois do banho, dorme sossegada. Adora quando pergunto "cadê a criança da mamãe?", ela sabe que é ela e fica toda boba. Esses dias vi na tv que os cães são considerados mais inteligentes que os macacos por conviverem socialmente com o homem. E essa convivência fez com que, ao longo do tempo, eles desenvolvessem a capacidade de nos entender. Hum. Eu já havia percebido. Quem tem um cachorro sabe disso. Tava lembrando de quando ela caiu da escada e teve que enfaixar a patinha. E a vez que fez cesariana e os pontos estouraram, porque ela não sossegava. Tudo eu achava que ela ia morrer e chorava litros. Ah, e as vezes que fugia pra rua e corria em círculos deixando todo mundo maluco atrás? Ninguém pegava e ela se divertia horrores com isso. Sacana! E as pirraças? Se eu deixasse ela sozinha em casa, logo tratava de fazer sujeira em cima da cama de alguém como forma de protesto. Eu ficava doida! Tem pavor daquela mesa de alumínio do veterinário. Era só colocar ela lá em cima e já começava pedir colo e tremer. Adorava viajar. Andou muito nas ruazinhas de Cananéia. Chupou muito pirulito quando era pequena. Era tarada por pirulito, bala e bolo de chocolate com maçã e passas da minha mãe. Era sentir o cheiro que ficava babando do lado da mesa. Tá aqui agora, olhando pra mim com a carinha mais triste do mundo, os olhos pesados de cansaço implorando para ir. Hoje ela vai. Tá sofrendo. E eu sofro junto. Hoje ela vai e não volta mais. É. Dói. Quando eu fiquei em depressão, trancada no quarto, era ela que não saía de perto nem por um segundo. Sempre me guardando, me fazendo companhia. Foi ela que me fez feliz. Foi ela que me deu força. Eu só não desisti, porque sabia que tinha elas duas pra cuidar. E quem ia cuidar direito delas? Quem ia dar atenção, conversar? Animal não carece só de comida e água. Agora taí, algumas poucas hora para desfrutar na presença dela e depois só nas lembranças. Eu não sei como vai ser sem ela todos os dias quando eu chegar em casa. Quando a chave fizer barulho na rua e eu não ouvir o latido dela. Não ver o riso, esse aí, da foto, nem o corpo sacudindo de alegria em me ver. Vai ser foda acordar e não dar bom dia, nem ver ela se espreguiçar com os olhinhos apertados de incômodo pela luz que eu acendi. Foda. Gente a gente sente, mas animal é diferente. Porque com gente a gente briga, sente raiva e tal. Animal não. É incondicional. Falei pra minha mãe, “se eu não chegar em casa hoje, você vai deixar de comer, de dormir? Não. Elas vão. Enquanto eu não chegar, elas não comem, não dormem e se eu não chegar nunca mais, elas morrem de tristeza”. Ai, caralho! Me segura, meu Deus!

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