Desligou o telefone e eu nem pude me defender. Assenti. Num gesto de raiva, porém contido, soltei a bolsa sobre a mesa e liguei novamente o computador. Sentei. Não conseguia entender o porquê de tudo aquilo. Pra quê? Sadismo, era o que me ocorria sempre. Raiva. Queria chorar. Covarde, eu? Pode ser... Outros peitariam e gritariam, mas eu não... Eu abaixo a cabeça, engulo seco e choro escondido. Não gosto de causar atritos, nunca gostei. Tremia. Recomecei o serviço e minha cabeça rodando não atinava às palavras que eu deveria ordenar. As pessoas riam e falavam alto, como que fazendo pouco caso, até mesmo se surpreendiam em me ver por ali àquele horário. Pois é, eu respondia.

***

Ela grita e pergunta num tom irônico qual o motivo de tanta pressa. Não me deixa responder. Eu realmente não sou uma pessoa ocupada. Eu nem mesmo sou uma pessoa para eles... O que eu sou? Merda. Nenhuma. Pra eles. Quem se importa? Pois eu digo, digo pra ninguém, porque ninguém quer saber mesmo, mas ainda assim eu digo. Eu tenho um monte de coisas pra fazer. Milhares. E justamente porque eu não tenho a minha bunda sentada num carro zero e pego exatamente dez conduções por dia, no mínimo, para me locomover entre trabalho-casa-faculdade é que eu digo que tenho muita pressa.

- Eu gritei no dia seguinte. Extravasei toda raiva contida de uma tarde amarela e doída. -


***
Quando saí de lá era um trapo. Um pedaço de trapo molhado e imundo em que haviam pisoteado e atirado contra a lama. É assim que me sentia. Prometi não mais fumar. Foda-se. Das minha dores sei eu. Comprei um cigarro solto e acendi com o isqueiro preto e amigo que guardo sempre na bolsa. A cada baforada não me sentia melhor, mas eu podia fazer algo sem que ninguém torrasse a minha paciência. Eu podia quase mastigar aquela porra daquele cigarro e respirar aquele ar gelado que parecia me rasgar por dentro e sentir a dor com minhas próprias mãos. Podia quase esgoelá-la. Parei na banca de jornal que eu detesto, porque o cara é mal-educado, mas precisava de um livro. É o tipo de coisa que me socorre nesses momentos. Vi logo Flaubert. Muito pesado. Eu ia me matar se lesse aquilo... Não vai dar, fica pra próxima. "Moço, me vê um Misto Quente do Bukowski."
Antes de abrir um livro, você deve abraçar, apertar, acariciar e trocar toda sua energia com ele.
Se resolvi? Ainda não sei...

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