Quando chove e a calha deixa a água escorrer com violência para a rua, as dores vão junto, bem devagarinho. Saem por onde não sei. Dissolvem-se na lama da sarjeta e fogem para um bueiro escuro qualquer. Seus resquícios é que ficam impregnados em mim. Esse laivo de dor é o que corrói minhas forças. Eu queria aniquilar meu passado e prever meu futuro, num gesto desesperado de quem quer estancar o mal do presente. Não há forças suficientemente grandes para arrancar você daqui...Não há. Porque o seu rosto aparece em minha mente a todo momento. E meu ódio por você é tão grande...Mas você sabe, a linha que separa o ódio do amor é muito tênue...É como uma lágrima, representa toda dor e toda alegria que contém. Eu ouço aqueles sons e me torturo durante horas. As novidades se misturam ao meu passado, a você e tudo é uma só dor. É compreensível tudo que aconteceu, se levarmos em consideração a linha da razão. Mas meu coração não consola...E cai cada vez que tenta te deixar pra trás. Tenho a sensação de que o passado foi melhor, pois o presente me mata! A vida não me dá uma chance de ser feliz...Quando deu, eu matei. Os sons das guitarras enlouquecidas ainda soam em minha cabeça. Ainda sinto seus olhos cravados em mim. As novidades não me querem. Elas me confundem. Não querem me ajudar a te esquecer. Eu fico aqui, me entupindo de ouvir aqueles sons às lembranças. Queria falar com você. Tem noites em que pego no telefone pra te ligar, mas sei o quanto vou me odiar depois. Eu sofro. Todos os dias da minha vida. Eu sofro. E ninguém sabe. Eu sorrio a maior parte do tempo enquanto o ácido corrói meu estômago. Jogo conversa fora, pulo, danço, brinco...Nada tira isso daqui. Você nem se importou quando fui embora. Nem deu adeus. Me odeia. E eu não consigo entender o porquê! Eu te amei! Mais que a mim mesma. Eu me doei. Desisti de coisas por você. Adoeci. Mas você só brincou comigo. Quando você sofria, eu ia lá e recolhia os seus trapos. Sofria contigo. Eu cuidava de você. Mas eu era o estepe. Você vinha e eu deixava...depois me dizia que era a ela que amava. Eu me odiava por mais uma vez ter acreditado em você. Naquele dia, no frio excruciante, no banquinho do mercado, você me abraçou. Colocou sua boca na minha e nos olhamos, até que eu disse NÃO. Você se espantou e achou impossível ser verdade. Deus sabe quanto doeu e como foi difícil fazer aquilo. Você e eu, abraçados, trocando calor para aniquilar aquele frio insuportável. Eu de vestido, roxa, gelada. Você, cabeça deitada em meu peito. E eu pensava: "Deus, porque eu não fujo daqui e fico vagando pelas ruas?". Mas era madrugada, não havia como voltar pra casa. Estávamos condicionados a ficar ali, abraçados. Era tão irônico! Lembra, fiz me acompanhar e esperar meu ônibus chegar. Me emprestou a camisa que eu levei lavada e passada. Quando o ônibus chegou, o sol estava alto, lhe dei o último beijo e fui. Você ficou me olhando atônito do ponto de ônibus. Li em seus lábios: " Filha da puta!" E eu ri. Ri, porque eu te enganei. E nunca mais. Já faz tanto tempo...Eu tinha dezenove quando te conheci. E lembro que me pegou pela mão, sorriu e me mostrou como as coisas funcionavam. Hoje eu sei como elas funcionam. É assim, cinza. Houveram tantos outros... Há tantos por aqui, me esperando. Outros me deixando. Uns me amando, enquanto eu sofro. Saio de mãos dadas com minha solidão e caminho por aí. Espero pra ver o que acontecerá. Minhas dores eu espanto a vassouradas. Faço meus poemas e lá ficam impressas as marcas que adquiri.


Eu só quero te deixar ir.

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